Imagens que chocam o público já estão ficando "corriqueiras". A polêmica em torno de se mostrar a cruel realidade de acontecimentos sempre traz a tona o velho dilema: informar ou evitar o choque do publico? Porém as coisas se complicam quando nos deparamos com situações onde é difícil contemplar esses dois pontos e temos que escolher.
Fala-se muito da convergência entre ambas levando-se em conta o bom senso de forma que a informação seja privilegiada pois, do contrário, estaremos mascarando e nos sobrepondo aos fatos. Mas até que ponto se pode questionar a divulgação de imagens que carregam uma carga emocional muito forte e tendem a chocar o espectador. É esclarecedor lembrar o trabalho do fotógrafo August Sander, que retratou o drama do povo alemão, registrando com tal veracidade, que contrariava a propaganda de Hitler e teve quase todo o seu acervo fotográfico destruído. Enquanto isso a fotógrafa e cineasta Leni Riefensthal vivia seus dias de glória, registrando a escalada nazista e virando as costas ao holocausto.
Em geral esta questão não é questionada quando falarmos de denúncia ou quando se é estetizada a miséria. Mas quando nos deparamos com cenas trágicas que fazem parte da nossa realidade, mas agridem porque mostram uma realidade na qual não queremos nos espelhar? E porque esse tipo de imagem nos remete a um sentimento ambíguo de repulsa e curiosidade? Nos últimos anos o jornalismo não tem tido tanto pudor em divulgar imagens profundamente impactantes em que são expostas de forma visualmente claras horrores e cenas que há tempos atrás nos repudiavam. Provavelmente essas imagens chocaram e impactaram quem as selecionou e faz o mesmo efeito a quem as “lê”.
As fotos dos corpos dos integrantes do grupo Mamonas Assassinas, mortos num acidente de avião em 1996, eram profundamente fortes e circularam abertamente pela internet onde tiveram e tem até hoje uma procura muito grande. A divulgação dessas fotos aumentou ainda mais o sentimento pelos jovens que tiveram interrompida a carreira de sucesso no pop nacional em virtude da tragédia. A grande mídia teve o bom senso de não publicá-las mas não o fez quando o ex-tesoureiro da Fernando Collor, PC Farias fora assassinado em na cama de motel com sua amante. A foto do crime ilustrou até os telejornais de horário nobre como o Jornal Nacional e foi publicada em quase todos os jornais impressos. Terá sido adotado o critério da publicação em virtude do caráter da vítima? Nem o ex-governador Mário Covas escapou das lentes da imprensa quando em estado terminal.
Muitas vezes vemos a transformação da triste realidade em objeto apuração do jornalista para o qual a informação é fundamental. Vislumbrar uma imagem que não é fantasia, que faz parte da dura realidade é em muitos casos algo que produz uma dicotomia na opinião pública e na própria mídia.
O registro da dor e da morte é um caráter documental de fotojornalismo ou uma busca sensacionalista? Será que a imprensa deve recriar a natureza com a qual se depara, com uma fidelidade absoluta? Será que informar é optar por uma imagem visualmente atraente e unicamente ilustrativa?
O importante é o respeito pelo que se deve mostrar, acima da ânsia de querer mostrar. O resultado estético, pode acrescentar expressividade ao fato, mas também pode ser uma faca de dois gumes na fria e datada efemeridade dos fatos.